21/07/2025

Governo Lula estuda limitar remessa de dividendos de empresas americanas com operação no Brasil

Por Isadora Duarte (Broadcast), Célia Froufe (Broadcast) e Vera Rosa
Fonte: O Estadão
BRASÍLIA – O Palácio do Planalto espera medidas ainda mais duras contra
o Brasil por parte dos Estados Unidos depois que uma operação da
Polícia Federal alvejou Jair Bolsonaro (PL) nesta sexta-feira, 18, obrigando
o ex-presidente a usar tornozeleira eletrônica. Agora, se as negociações com os
EUA não avançarem, o governo Lula avalia novas frentes de reação. Uma das
ideias em estudo prevê até mesmo limitar a remessa de dividendos de empresas
com sede nos EUA e operações no Brasil.
Após a publicação da reportagem, o ministro da Fazenda, Fernando
Haddad, disse ao Estadão/Broadcast que o governo não planeja adotar
medidas mais rígidas de controle sobre dividendos, caso as tratativas para
reverter o tarifaço de 50% aos produtos brasileiros não prosperem.
Embora o ministro negue, a proposta está sob análise e chegou ao comitê
interministerial que cuida das negociações sobre qual deve ser o tom da resposta
aos EUA. O governo precisa ter cartas na manga para reagir se o presidente
dos EUA, Donald Trump, decidir endurecer ainda mais o jogo.
A resposta sob avaliação do governo inclui, em primeiro lugar, a quebra de
patentes de medicamentos, como antecipou o Estadão/Broadcast. A
proposta de limitar remessas de dividendos realizadas por multinacionais
americanas instaladas no Brasil também está na mesa, embora haja divergências
sobre isso dentro do governo.
Na prática, o Planalto começou a se debruçar sobre várias possibilidades antes
mesmo de o secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, anunciar nas
redes sociais, nesta sexta-feira, 18, que determinou a revogação dos
vistos americanos do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF)
Alexandre de Moraes, familiares e “aliados” na Corte. Outros sete
magistrados também tiveram o visto cassado.
A operação da Polícia Federal que envolveu Bolsonaro foi autorizada por
Moraes – e confirmada pela Primeira Turma do STF–, um dia depois de
Trump enviar uma carta ao Brasil pedindo que a “perseguição” contra o
ex-presidente cessasse imediatamente.
A prioridade do governo brasileiro, neste momento, é levar as negociações com
os EUA ao extremo e esgotar a via diplomática. Três interlocutores do
presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) disseram ao Estadão/Broadcast,
porém, que uma reação mais firme pode ser adotada a partir de 2 de agosto, se
as negociações não vingarem.
As opções têm sido analisadas pelo Planalto, após passarem por escrutínio
técnico, mas tudo estará em aberto até que o Brasil veja necessidade de fazer
algum anúncio para responder às sanções, como a abertura de
investigações sobre práticas comerciais do País.
Alas do governo divergem em relação a algumas das propostas, como a de
maior controle sobre as remessas de dividendos aos EUA, mas admitem que
são sugestões no cardápio. A decisão ainda depende do aval de Lula.
Interlocutores do presidente disseram, sob reserva, que haveria uma gradação
sobre qual o volume de dividendos teria de ficar no Brasil. Seria uma operação
similar à progressividade que o governo tenta emplacar na área tributária.
A “régua”, no entanto, não foi definida. Não está acertado se seria levado em
conta o tamanho do lucro da companhia no Brasil ou apenas o montante
destinado aos dividendos.
O governo não pretende proibir as remessas de lucros das empresas, mas inserir
mecanismos de maior monitoramento e fiscalização no processo.
Representantes dessas companhias também já externaram ao vice-presidente e
ministro da Indústria e Comércio Geraldo Alckmin, que coordena o comitê
interministerial e tem conduzido as negociações, preocupação com a eventual
medida. Argumentaram, por exemplo, que há necessidade de previsibilidade
para manutenção dos investimentos no País. Aproximadamente 4 mil empresas
americanas atuam hoje no Brasil.
O objetivo do Planalto é levar as tratativas ao limite e retomar o diálogo
bilateral. A posição também vem sendo defendida pelos exportadores que
seriam mais afetados pela taxação.
No momento, a quebra de patentes é a medida com mais chance de ser adotada
como reação do Brasil porque foi a primeira saída avaliada pelo governo assim
que Trump venceu a eleição, no fim do ano passado, e começou a incorporar
ameaças comerciais em seus discursos.
Os estudos foram interrompidos quando o Brasil ficou entre os países com as
menores sobretarifas – de 10%, no Dia da Libertação, de 2 de abril. Mas a
suspensão das patentes de remédios é considerada uma das ações mais
eficientes para sensibilizar o governo norte-americano, dado o peso da indústria
farmacêutica nos Estados Unidos.
Um dos técnicos que participam das negociações citou inclusive o Mounjaro,
com recente aprovação no Brasil. O medicamento para tratamento da diabete,
fabricado pelo laboratório Eli Lilly, é também um sucesso de vendas no
controle da obesidade.
A quebra de patentes já foi adotada no País. Durante o contencioso do algodão,
disputa que se estendeu de 2002 a 2014, os Estados Unidos retomaram as
tratativas com o Brasil somente após a ameaça brasileira de quebra de
propriedade intelectual e de patentes.
Big techs também estão na mira de Lula
Além dessas medidas, Lula também mira as big techs. A Organização para
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é a instituição
multilateral que vem liderando estudos nessa área, assim como o grupo das 20
maiores economias do mundo (G-20).
São vários os modelos de controle de big techs analisados no Brasil. Os EUA
têm se mostrado refratários a todos os tipos de imposição de tributos, já que a
maior parte das empresas está em solo americano, embora a maioria dos
consumidores esteja em outros locais.
As discussões giram em torno de como migrar pelo menos parte dos impostos
pagos por essas gigantes, da origem para o destino.
O endurecimento para o controle da entrada de americanos no Brasil
também foi apontado como uma medida possível de ser adotada, mas, até o
momento, a proposta foi rejeitada por integrantes do governo.